ABSCESSO PERIRRETAL POR MICOBACTÉRIA NÃO-TUBERCULOSA COMO COMPLICAÇÃO DO USO INADVERTIDO DE ANABOLIZANTES INJETÁVEIS

O grupo Mycobacterium fortuitum é composto de micobactérias de crescimento rápido, causadoras frequentes de infecções de pele e partes moles usualmente por inoculação direta. Estão relacionadas a infecções de sítio cirúrgico, infecções de cateteres, medicações injetáveis, trauma ou tatuagens, geralmente através da contaminação de soluções ou equipamentos médicos. Relatamos o caso de um homem cis, 24 anos, sem comorbidades, que estava em uso de anabolizantes injetáveis inadvertidamente, com condições de armazenamento e antissepsia inadequadas. Após três meses, apresentou celulite em nádega direita, para a qual realizou múltiplos tratamentos antimicrobianos sem melhora clínica. Cinco meses após a última aplicação, apresentou piora da dor local e foi internado para abordagem cirúrgica, após evidência de abscesso em glúteo, região inguinal e pélvica perirretal à direita em exame de imagem. O material purulento obtido na drenagem do abscesso foi enviado para cultura e houve o isolamento da micobactéria do grupo Mycobacterium fortuitum. Recebeu antibioticoterapia com doxiciclina, amicacina e levofloxacino por 5 semanas, e logo após transicionado para doxiciclina, ciprofloxacino e claritromicina com programação de tratamento por um ano. O teste de sensibilidade demonstrava resistência à moxifloxacina e ao sulfametoxazol-trimetoprima. Houve resolução dos sinais inflamatórios e da drenagem purulenta local. A maioria dos casos de infecção de pele e partes moles por M. fortuitum tem infecção limitada, porém neste caso apresentamos um paciente com evolução atípica devido à extensão da infecção com formação de abscesso perirretal. Além disso, poucos são os relatos descritos na literatura relacionados ao uso de anabolizantes injetáveis. A apresentação clínica da infecção por M. fortuitum geralmente é de nódulos solitários, porém também podem ocorrer abscessos, celulite, foliculite, linfadenite e osteomielite. Este grupo de bactérias é suscetível in vitro a amicacina, cefoxitina, imipenem, tetraciclinas, sulfonamidas, fluoroquinolonas e linezolida. O tratamento geralmente envolve duas a três drogas com atividade contra estes organismos e a duração do tratamento é individualizada. Desbridamento cirúrgico é considerado um tratamento adjuvante importante em alguns casos. Este caso ilustra o potencial patogênico de bactérias de grupo M. fortuitum em procedimentos não médicos com quebra de barreira cutânea e a necessidade de suspeição em casos de apresentação similares.